terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Ritornelo!

Tudo se deteriora. Tudo se esvai. Somos apenas máquinas de rastros, rastros que serão rastreados somente por aqueles que souberem rastrear. Mas como saberão que sabem rastrear? no final das contas, rastros são apenas vestígios. somos a virtualidade de vestígios. Virtualidades da produção de sentido. Não sei mais pra onde vou, nem quem sou, nem se sou. Nem sei se ligo.

2008: o ano que não passou. (ao som de "Come rain or come shine, by Billie Holiday)

Música acessível em:

http://www.youtube.com/watch?v=1EBPtV449Uw

Enquanto espero o editor de textos iniciar, para que assim eu possa continuar a confecção de um relatório, escrevo este texto. Na verdade, assim que terminei de escrever a última frase, o Word já estava aberto, mas preferi deixá-lo assim e postergar a confeccção do relatório.

Billie Holiday torna possível a existência de vida neste dia chuvoso. Este ano correu. Olho pela janela, tenho vagas lembranças dos confetes espalhados no asfalto, a caipirinha chorada na minha mão, o gingado de Nuelna, o charuto de Ronie, o exótico paladar de Fory para cachaças... Eu puxando marchinhas no Carmelitas, fazendo aquela multidão de foliões seguirem as minhas ordens, para espanto de Fory... Tudo lá trás. Passagens, diria no início do ano.

Bebo água. Neste ano tivemos um agravemento de crise econômica, o primeiro black president nos EUA, a mulher-melancia segiu carreira solo, a Flora (aquela da novela... não, não conheço a novela) matou muita gente, mas a fauna humana continua fazendo mais estragos. Virei Mestre, professor universitário, um ano de Doutorado (a tese andou? para onde?), mudei de casa e de vida... Fory voltou para New Orleans, a avó do Eric morreu. O Tales nasceu.

Comprei minha primeira camisa amarela e minha primeira camisa vermelha. A Nina Simone continua Nina Simone...

Descubro que ando muito, MUITO sem tempo. Mas fiz amigos. Bons amigos. Descubri a carmenère. Não sei como vivi todo esse tempo sem a carmanère. Descobri que tenho novos planos... um deles é aprender a viver com menos planos. Descobri pisco, também. Senti saudade de alguns amigos.

Descobri que viver é uma arte difícil. Descobrir que viver com elegância é quase impossível, às vezes...

Chega.

Fiz um relatório (parcial) de meu ano que ainda não acabou. Bebo água, salvo este texto, vou confeccionar... relatório.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Passagens. Cássia Eller.

Deixo os confetes caírem de meu corpo durante o banho. Restos de um carnaval que marca novos indícios... de mudanças para mim mais importantes que a quaresma. Cássia Eller canta com a força de guerreira e a sensibilidade de uma garotinha. Ela me faz sentir algo intenso, forte, um sentimento de intensidade da vida. Tenho de terminar os últimos retoques da dissertação. Motivos internos e externos me atrapalham nisso. Pego uma colher de geléia de framboesa -preferência que fica entre os rastros que ficam em mim da passagem de uma pessoa importante em minha vida.
Essa é a primeira vez que vou falar algo pessoal neste blog: tenho que fazer planos pra minha vida. Não que eu não tenha feito antes, mas preciso de novos.
Carnaval.
Ah, gente, a vida é a arte do encontro. E o que levamos dela são apenas os encontros.

domingo, 6 de janeiro de 2008

Chuva e Billie Holiday (ao som de "One for my Baby", by Billie Holiday)

Música acessível em:

http://www.youtube.com/watch?v=R7llu2aQRSQ&feature=related

Chove.
Billie Holiday é maravilhosa para estas horas em que você está perdido entre o fim de algo e o início de um outro. Mas, se a vida é feita de inúmeros interstícios, seria a vida maravilhosa para se ouvir Billie Holiday? Estaríamos sempre a criar e terminar, e rascunhar, e deixar por inacabado para depois voltar? Seríamos seres inclinados, dedicados, condenados a começar projetos após terminar outros, sempre na busca de uma obra-prima que nos daria satisfação plena? Algo de "um orgulho do criador", que olharia sua obra, diria que está bom, descansando após isto? Mas sempre haveria algo por criar... cursos, carros, casas, cargos, filhos...

E se, caso contrário, estas demarcações, estes períodos que marcamos em nossas vidas, fossem apenas divisões fantasiosas que marcamos na tentativa vã de fazermo-nos centro de nosso(s) mundo(s), e nos sentirmos senhores de nossas ações, vontades e desejos? Neste caso, não haveria nenhum momento para escutar Billie Holiday: seria a vida um grande e contínuo fluxo, que nos guiaria desde o momento de nosso nascimento até à morte. Não haveria escolhas, nem mudanças que fossem por nós produzidas. Vida: engodo em grande - e musical - fluxo. Dissonâncias, ressonâncias, harmonias, melodias, tudo em diração a um ponto final -que, em algum momento, acontece. Não como fim, mas como ocaso. Vide jazz. Seríamos marionetes em um teatro sem manipulador. As cordas puxam bonecos que puxam cordas... No final das contas, não haveria sequer a necessidade de pensar os bonecos, pois estes seriam apenas o cruzamento entre as influências das cordas umas nas outras.

Billie Holiday é maravilhosa para estas horas em que você está perdido entre o fim de algo e o início de um outro. Mas, afinal, existe ou não, este momento, estas horas?

Não sei. Não chove mais. Vou escutar Billie Holiday.